quinta-feira, 30 de julho de 2015

São tantas as explicações para a Crise

Fui há dias comprar o livro do economista Ricardo Paes Mamede, «O Que Fazer Com Este País». De passagem dei uma olhada pelos escaparates e mesas com livros sobre temas da actualidade. Coisa que - em Portugal - já não fazia há umas semanas.
Pelos vistos, qualquer visita a qualquer livraria dá para ver algumas dezenas de livros a explicar a crise e a discutir a dívida... Também há alguns livros a explicar como sair da crise e os meandros da corrupção e de «como chegámos aonde estamos»... Sobre isso cada um que faça as suas leituras e as suas opções.
Para já vou ler o livro com todo o interesse que o mesmo merece e até pelo respeito intelectual que me merece o Ricardo.
Entretanto - e porque o panorama livreiro em França é muito parecido - deu-me para deixar aqui algumas reflexões sobre a «CRISE».
E começo com algumas ideias fundamentais sobre a análise marxiana do sistema capitalista. Depois de algum estudo da referida análise marxiana direi que o edifício teórico desta análise assenta sobre dois grandes pilares:
1. Em primeiro lugar destaco o estudo da relação entre "valores" e "preços". 

Sobre isso há dezenas (julgo mesmo que centenas) de artigos sobre o famigerado «problema da transformação (de "valores" em "preços de produção"). Em tempos dei-me ao trabalho de traduzir «meia dúzia» desses artigos. Terei muito gosto em enviar os PDF's a quem estiver interessado.
Caracterizam-se todos por extensos e complexos exercícios matemáticos.
Para mim a explicação é razoavelmente simples e reside no reconhecimento do papel instrumental (...) dos "preços" na captação de "valores".
2. Em segundo lugar destaco o estudo sobre uma (muito discutida) lei da queda tendencial da taxa de lucro. 

Como a busca do lucro é o motor de toda a actividade empresarial capitalista, é no mínimo insólito que este assunto - do comportamento evolutivo da taxa de lucro - não mereça mais atenção mediática. Estou aqui a lembrar-me da atenção mediática dada à «descoberta do "bosão de Higgs"» (coisa crucial para a vida de milhões desempregados...).
Sobre essa famigerada lei da queda tendencial também há centenas de artigos mas - devo assinalar - tudo isso nos círculos esotéricos de alguns meios académicos. E no entanto é isso - o comportamento da taxa de lucro - que, tal como as "fundações" dos prédios que fazem os engenheiros civis, está na base dos sobressaltos todos da nossa vida económica.
Entretanto, aqui há uns atrás veio um senhor economista matemático japonês - de seu nome Nobuo Okishio - demonstrar por «a + b» que afinal não só não há nenhuma queda tendencial da taxa de lucro, como até o que há é uma subida tendencial da dita cuja taxa de lucro. Segundo Parijs (1980) o assunto ficava encerrado e não valia a pena falar mais nisso.
Pois bem, reclamo para mim o mérito (?...) de ter demonstrado, por via de um algoritmo elaborado já há uns trinta e cinco anos, que «está quase tudo certo e está quase tudo errado»... O estudo de Hegel dá nisto...
Quero eu dizer que há umas fases em que a taxa de lucro tende a subir e depois há umas fases em que tende a descer... E pelo meio há uns períodos de «transição de fase».
Era tão bom se houvesse gente com poder político que quisesse perceber isto.
E se a minha avó tivesse asas voava.

domingo, 12 de julho de 2015

«A Dívida Pública liquida da Grécia é de 18% do PIB, não 175%. E a da Alemanha?»

Pelo seu interesse, transcrevo para aqui um artigo de opinião da revista FORBES publicado em Janeiro deste ano de 2015 e no qual «acabo de tropeçar»...

http://www.forbes.com/sites/panosmourdoukoutas/2015/01/22/greeces-net-debt-is-18-of-gdp-not-175-whats-germanys/

Escreve Panos Mourdoukoutas, colaborador da revista FORBES:

«Antes de impor à Grécia mais uma ronda de austeridade, a Alemanha deveria corrigir o seu próprio problema de contabilidade – calculando a dívida grega, e a sua própria, usando normas internacionais aceites. Enquanto os cidadãos gregos vão votar este Domingo, os funcionários alemães não deixaram passar a oportunidade de lembrar a Grécia de que tem que cumprir as suas obrigações da dívida. Isto significa adoptar uma austeridade sem precedentes a qual tem deprimido a economia grega.
O problema é que a Alemanha tem estado a sobre estimar a dívida grega ao não seguir os padrões do «International Public Sector Accounting Standards (IPSAS)» os quais medem os compromissos e os activos ao longo do tempo.
De acordo com o Professor Jacob Soll, os padrões IPSAS são similares aos que são utilizados pelos principais governos, bancos e investidores em todos os níveis. «De facto, a dívida foi calculada como sendo maior do que realmente é ou seria se tivessem sido usados os padrões "IPSAS", escreveu Soll num recente artigo no New York Times.
Exactamente em quanto foi sobre estimada a dívida grega?
A resposta pode encontrar-se em www.freegreece.info.
Se forem aplicados os padrões do "IPSAS Board" para calcular a dívida grega, a dívida líquida é de 18%, não 175% do PIB. E qual é a situação no caso da Alemanha seguindo os padrões do "IPSAS Board"?... 46% do PIB.
Isto quer dizer que a situação da dívida da Grécia é melhor do que a da Alemanha!
Então porque razão a Alemanha não usa (o padrão) IPSAS para calcular a dívida grega?...
De acordo com o profesor Soll, por duas razões.
Escreve este autor que, em primeiro lugar, (os alemães) não aplicam (os padrões) IPSAS na sua própria casa. «Um facto pouco conhecido é que os alemães também não usam (os padrões) IPSAS e têm padrões de contabilidade pública notavelmente opacos».
Em segundo lugar, mantendo-se fora dos (padrões) IPSAS, a Alemanha pode manter a Grécia em rédea curta ao mesmo tempo que mantêm a dívida grega fora dos seus livros de contabilidade.
Escreve Soll que «uma razão poderá ser que os alemães se têm recusado a apreçar razoavelmente a dívida ou a reportar correctamente o seu valor, o que significa que, no curto prazo, extraem dos Gregos mais austeridade do que deviam e também porque assim mantém estes empréstimos fora dos registos do balanço orçamental pois que os mesmos apareceriam como perdas sob qualquer padrão legítimo de contabilidade».
(uma forma mal encapuçada de transferir para os gregos as perdas dos bancos alemães, as quais deveriam ter sido suportadas pelos contribuintes alemães, digo eu - GFS)
Na nossa opinião há uma terceira razão. Sobre estimando a dívida soberana dos países do Sul da Europa, aumenta-se a ansiedade nos mercados de câmbios, deprimindo o Euro e potenciando a máquina exportadora da Alemanha».
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Jacob Soll é autor de diversos livros sobre a História da Dívida e das práticas de contabilidade ao longo da História, designadamente «The Reckoning: Financial Accountability and the Making and Breaking of Nations». Há uma tradução em Português («O Ajuste de Contas»).

Para saber coisas sobre o IPSAS, pode visitar-se o portal da «International Federation of Accountants» em http://www.ifac.org/public-sector