terça-feira, 5 de março de 2013

A propósito de alguns «debates» nas nossas inefáveis TV's

Ainda ontem ouvi mais um debate em que intervinham além da sra. «pivô» uma outra senhora entendida em coisas de «segurança social» e um senhor mais avinagrado e aparentemente muito em entendido em coisas de má governação do estilo «está tudo errado» ou «estes tipos só fazem asneiras»... Em alguns aspectos não deixa de ter razão.
Mas ontem – pelo que me foi dado entender - a conversa era sobre a sustentabilidade do actual regime de pensões e reformas. Ou seja, a sustentabilidade da nossa Segurança Social.
Falou-se de Lord Beveridge (um dos pais fundadores do moderno Estado Previdência) assim como de Bismarck e das suas ideias sobre segurança social para os trabalhadores.
Vieram ao de cima números e "factos" como «há 320.000 beneficiários da seguranças social que nunca contribuíram»... 
Coisa horrível, claro, dirão as mentes bem pensantes. Veio também o alerta para o perigo – para a sustentabilidade financeira da segurança social – desse «desastre» universal que é o facto de as pessoas cada vez viverem mais tempo... Essa pessoas («uns malandros», «golpistas»... imagino eu claro, ninguém falou assim...) não se dão conta de que os actuários (são uns senhores especialistas em cálculo de probabilidades e que trabalham para as companhias de seguros...) quando calculavam as pensões de reforma pensavam que as pessoas em média morriam dois ou três anos depois da reforma... Agora - «malandros» - ficam vivos até aos 80... Ou seja, mais uns 10 a 15 anos do que o previsto.
«E não há dinheiro para pagar isso tudo».
Eu gostava mesmo era que as pessoas – os «economistas de aviário1» e outros «fazedores de opinião» - percebessem do que é que se está a falar quando se fala em «SISTEMA».
Já não digo para irem estudar a «Teoria Geral dos Sistemas» de Ludwig von Bertalanffy... Que ao menos entendessem que um sistema é um conjunto integrado de partes componentes, cada um desses componentes com determinados orgãos e funções convergindo nas tarefas para alcançar um qualquer determinado objectivo (do dito cujo "sistema"...).
Que percebessem que há «sistemas abertos» e «sistemas fechados» e «sistemas "assim-assim"» (ou seja com determinados graus de porosidade...).
E que o «sistema capitalista mundial» há muito que deixou de ser um sistema aberto...
E que percebessem que se algum das partes componentes deixar de executar as suas funções sistémicas, a coisa dá inevitavelmente «para o torto»... 
Talvez assim esses «economistas de aviário» (e outros fazedores de opinião encartados) entendessem a expressão «os reformados – mesmo não fazendo rigorosamente mais nada para além de "descansarem" - desempenham uma insubstituível função sistémica: a função de consumirem».
Até o «pároco» Thomas Malthus entendia isso da vantagem (ele dizia mesmo «necessidade») de haver uma classe "parasita" cuja função sistémica seja apenas a de consumir...
A diferença entre o referido «pároco» e pensadores modernos bem mais progressistas é que Malthus defendia a utilidade (a necessidade) sistémica da existência de classes (verdadeiramente) parasitas como eram a aristocracia latifundiária e a Igreja do seu tempo2, enquanto que o que agora se defende é o direito elementar (de reformados e pensionistas) a serem reconhecidos como socialmente úteis e, sobretudo, a serem pagos hoje também por aquilo que contribuiram ao longo de décadas.
No que diz respeito aos tais «320.000 que nunca contribuíram», o mínimo que se pode dizer é que pessoas com exposição mediática deviam ter alguma vergonha na cara para assim meterem no mesmo saco, por um lado, muitos exemplos de contratos leoninos por parte de arrivistas e alguns políticos de carreira que, saltitando de empresa pública em instituto ou fundação pública, vão garantindo para si chorudas pensões vitalícias e, por outro lado, as poucas centenas de milhar de trabalhadores (quase sempre rurais) que ainda sobrevivem dos tempos em que não havia em Portugal uma política generalizada de «segurança social»...
A pergunta que esses «fazedores de opinião» deviam fazer é antes a de saber se esses trabalhadores e trabalhadoras, do campo e do trabalho doméstico, contribuiram ou não para o processo global – sistémico – de acumulação capitalista, nesta fracção nacional do «sistema» a que chamamos Portugal.
Não há pachorra...
 
1Perante o bombardeamento ideológico e a barragem desfinformadora com que somos todos confrontados, tiro o chapéu – bato palmas e preito de admiraçãoa todos aqueles economistas que conseguiram «dar a volta» por cima e quebrar as amarras sufocantes do pensamento único imposto aos estudantes de teoria ou análise económica...
2A esse respeito, a sua polémica com David Ricardo ficou nos anais do pensamento económico; revisão de matéria que se recomenda a todos os nossos «economistas de aviário»... Aquilo não é só para «empinar»; é sobretudo para perceber e entender em que medida se aplica aos tempos que vivemos

2 comentários:

  1. Meu caro
    Assisti a uma parte do referido programa, depressa desliguei, pois como é habitual com aquela gente não se aprende nada, é conversa para analfabetos.
    O texto que publicou sobre esse grupo de opinadores é claramente apropriado.

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    1. Fez bem... Eu, às vezes, forço-me a ouvir aquela tralha toda só quase por «obrigação profissional»...

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