«De
volta à «origem» do lucro - Jean
-Marie Harribey
Tal
uma má consciência , a questão da origem do lucro regressa
periodicamente ao debate teórico. De cada vez, é uma oportunidade
para desenterrar Marx, o pai da mais controversa explicação do
lucro, e de o enterrar outra vez logo em seguida porque o seu modo de
tirar a teoria do lucro do quadro estrito da economia não é
admissível para a grande maioria dos economistas. Nas
últimas décadas, vimos a onda de discussões dos anos 1960-1970 em
volta do problema dito da transformação, depois de Sraffa ter
expressado correctamente um sistema de preços de produção. Essas
discussões levaram à constatção de que eram considerados dois
tipos de soluções para aquele problema: uma, que vai de
Bortkiewicz, Seton e Morishima, que não aceita os conceitos de Marx
(soma dos valores = soma dos preços na produção e soma das
mais-valias = soma dos lucros ), e outra, enunciada quase
simultaneamente por Dumenil, Foley e Lipietz, restabelecendo o
conjunto da problemática de Marx. Houve
a partir daí, na década de 1980, um interesse renovado na questão
da origem do lucro quando a teoria keynesiana do circuito enfatizou a
antecipação do lucro por meio da criação de monetária de
dinheiro que permite acumulação de capital. Recentemente,
Henri Denis voltou a repetidamente a este lancinante problema para
refutar a teoria do sobre-valor de Marx e restaurar a honra uma tese
de Kalecki que Boulding havia reformulado em 1950 ao localizar a
fonte de lucro no... lucro.»
Uma
coisa que talvez surpreenda muito boa gente é o facto (insólito?...)
de que os «economistas convencionais» (os da linha principal, quase
sempre alinhados com a «engenharia social» do neoliberalismo
e as respectivas e actuais políticas de austeridade), não são
capazes, esses economistas, de explicar (enfâse no "explicar")
a ORIGEM do lucro.
Por
outro lado, salvo algumas e eventualmente raríssimas excepções, os
referidos «economistas convencionais» nunca leram qualquer coisa
escrita por Karl Marx relativamente ao funcionamento da
economia capitalista. Alguns terão lidos criticas em segunda
ou terceira mão dizendo (explicando, demonstrando...) que Marx
«estava errado» e ficam-se por aí... Por vezes admitem que terá
sido uma personalidade incontornável no campo das ciências sociais,
mas como «economics não é uma ciência social», não vale
a pena um economista digno do seu nome perder muito tempo com isso...
Se um qualquer prémio «"Nobel" de Economia» diz que a
análise de «O Capital» está errada não vale certamente a pena
perder muito tempo com isso...
E,
no entanto, se se dessem ao trabalho de estudar os apontamentos que
Marx foi elaborando ao longo da vida – e vertidos em forma de livro
– sobre a lógica de funcionamento do sistema capitalista, talvez
viessem lá a encontrar alguns argumentos interessantes para defender
os seus interesses de classe: uma explicação marxista da origem do
lucro, sem recorrer a alguns conceitos «perigosos», tais como «luta
de classes», «valor acrescido» (vulgo, «mais-valia»), trabalho
excedente, e sobretudo o conceito de «exploração» (essa coisa
abjecta e ultrapassada que os empresários capitalistas, mais
honestos e cumpridores, nunca fazem...)
Então
é assim: a certa altura, no capítulo XIII, do Volume I de «O
Capital), dedicado à Cooperação, vem este parágrafo prenhe de
ilações.
«A
força produtiva que o trabalhador desenvolve como trabalhador social
é, portanto, força produtiva do capital. A força produtiva social
do trabalho desenvolve-se gratuitamente tão logo os trabalhadores
são colocados sob determinadas condições, e o capital os coloca
sob essas condições. Uma
vez que a força produtiva social do trabalho não custa nada ao
capital e, por outro lado, não é desenvolvida pelo trabalhador,
antes que seu próprio trabalho pertença ao capital, ela aparece
como força produtiva que o capital possui por natureza, como sua
força produtiva imanente.»
Como
disse mais acima, um dos problemas fundamentais que (não) aflige os
economistas convencionais é a explicação da origem
do lucro. Como aparece e de onde vem...
Aquilo
que se encontra com toda a naturalidade e frequência é a
justificação do lucro. Designadamente o facto de os
empresários assumirem riscos e, portanto, o lucro ser para eles e
seus apologistas «o prémio legítimo do risco assumido». Mas,
sobre como é que ele aparece, como é que o risco em si mesmo é uma
causa do lucro, sobre isso não se contram grandes (poucas ou
nenhumas...) explicações.
Pois
bem, se aqueles senhores se dessem ao trabalho se estudar o Capital,
da mesma maneira que muitos (quase todos?...) os economistas de
formação técnica marxista, estudam o marginalismo, o utilitarismo,
o monetarismo (e outros "ismos" colaterais...) talvez
encontrassem naquele parágrafo escrito pela mão de Marx uma
explicação razoável e perfeitamente lógica e coerente para
explicar a emergência de um valor acrescido («sem exploração»...)
e que corresponderia ao aparecimento de um montante extra
de riqueza social a que depois – em regime capitalista - chamamos
«lucro». A emergência de uma
parte do montante
adicional de riqueza gerada pelo trabalho assalariado («valor
acrescentado», «valor acrescido», «sobre-valor», «excedente
económico» ou ainda «mais-valia»... ou como lhe queiranm
chamar...) teria assim origem naquilo a que agora se chama – em
teorias e técnicas de gestão - «efeito de sinergia». Ou seja,
pelo menos uma parte do lucro poderia
(ênfase no «poderia»)
ser explicado também como resultado da sinergia do trabalho em
conjunto. E não necessariamente como resultado da exploração.
Este
efeito de sinergia (e o efeito da presença de «um outro» a emular)
tem sido demonstrado em várias experiências de psicologia social,
incluindo experiências com diversos tipos de animais. Até
baratas... Observou-se mesmo que o simples facto de haver
espectadores – que proporcionem aquilo a que se chama «reforço
positivo» - leva a um maior desempenho por parte do grupo observado.
Observações
Disponível
em PDF -
http://www.google.pt/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&ved=0CDEQFjAA&url=http%3A%2F%2Fharribey.u-bordeaux4.fr%2Ftravaux%2Fvaleur%2Fprofit.pdf&ei=OJ6MU4blIajI0wXe_YGABg&usg=AFQjCNHvugP-Et3mzfpU2SzaosG_Xe6wcg&sig2=EwRHFc36LB52s-LlgQ25eg&bvm=bv.67720277,d.d2k
Este
parágrafo aqui por mim sublinhado a «amarelo claro» podia ser
utilizado pelos apologistas do Capital como uma legítima explicação
para a emergência do Lucro... Em vez de se perderem nos meandros das
justificações moralistas do «lucro como prémio pela assunção de
risco»... GFS Na edição «Penguin Classics» encontra-se na
página 451. Na edição «Garnier Flammarion» encontra-se na página
247. Curiosamente esta versão em Inglês utiliza o termo «inerente»
(inherent») enquanto que a versão em Francês utiliza de facto o
termo «imanente». O termo «imanente» aparece também na versão
em Inglês disponível na Rede em formato PDF, e acessível aqui
https://www.google.pt/search?q=Capital+Marx+Book+1&ie=utf-8&oe=utf-8&aq=t&rls=org.mozilla:pt-PT:official&client=firefox-a&channel=np&source=hp&gfe_rd=cr&ei=zluHU42QAeze8gfUqIDICw
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